Se você caiu de paraquedas por aqui, um aviso: esse é o tipo de texto que não costuma agradar torcidas organizadas políticas. Quer dizer, à exceção de quem já se identifica como liberal, é mais provável que quem milite pelas ideias de esquerda naturalmente rejeite esse artigo, tratando cada linha exposta aqui como mera propaganda de direita socialmente consciente. Esse parece ser o caminho também daqueles que se identificam com os valores mais tradicionais da direita, que muito provavelmente rebaixarão cada vírgula desse texto a uma mera propaganda de esquerda economicamente consciente.
De fato, o
material a seguir não foi escrito para nenhum grupo militante. Cada
palavra aqui foi publicada para leitores intelectualmente curiosos que
se identificam com a esquerda, mas buscam encarar o debate público com
isenção, apreço pela razão e ceticismo às propagandas políticas que
prometem verdadeiros milagres com a mesma facilidade com que os
palanques são construídos. Há gente inteligente e razoável o
suficiente em todos os campos políticos e é para esse leitor que esse
texto foi construído.
O que move
as bandeiras retratadas nos pontos a seguir é parte do liberalismo
muito antes do socialismo sequer existir como uma ideia política. Por
isso soa tão estúpido, aliás, quando um crítico do liberalismo utiliza
dessas pautas para dizer que os liberais fazem alguma espécie de lobby pela
esquerda em determinados campos – e pior, usa desse tipo de discurso
muitas vezes como se criasse uma crítica original, que escancara as ingenuidades liberais; um dedo em riste que busca colocar o liberalismo em seu devido lugar e o acusa de estar a serviço de uma outra
visão política. É só bobagem, com alguns séculos de atraso. Discurso de
quem nunca teve acesso a mais básica literatura liberal.
O
liberalismo é, em essência, uma filosofia política e econômica que
defende a liberdade não apenas a partir de um princípio ético, mas pelas
suas consequências na vida das pessoas. Ou seja, entende que a
liberdade individual e de mercado não é só moralmente superior às
organizações coercitivas de outras filosofias não comprometidas com esse
ideal, como é parte importante daquilo que explica os grandes avanços
da humanidade nos últimos três séculos.
Caso você se identifica com os valores costumeiramente tratados como de esquerda,
mas ainda não se tornou um desses militantes plenamente convencidos das
suas aplicações no mundo real, esse texto foi escrito para você. Chegou
a hora de conhecer o outro lado da história. Acredite, ele é muito
menos sombrio do que você imagina.
1. Pelas minorias.
Talvez você nunca tenha ouvido falar nessas palavras, mas “laissez faire, laissez aller, laissez passer”
é a expressão máxima do liberalismo. Quer dizer, se ele fosse um
produto, certamente seria o seu slogan. Em português quer dizer “deixai
fazer, deixai ir, deixai passar”.
Em outras palavras, é a defesa do “cada um no seu quadrado”, do “não faça com os outros o que você não gostaria que fizessem com você”.
Em essência, é a ideia que as pessoas são livres para seguir os seus
próprios valores e preferências, desde que esses valores e preferências
não interfiram nas escolhas de outras pessoas. Ou seja, você é livre
para ser cristão, judeu ou muçulmano. Você só não tem o direito de sair
por aí explodindo as pessoas só porque elas não seguem a mesma religião
que a sua.
O liberal é
aquele cara que defende que um casal gay tenha o direito de portar
armas para proteger a sua plantação de maconha. E tudo isso enquanto ele
mesmo possa manter um código de conduta conservador no seu trato
pessoal. Ou seja, ele pode perfeitamente estranhar a homossexualidade, a
ideia de adquirir uma arma e o uso de substâncias psicoativas. Ele pode
até organizar uma passeata contra isso tudo. Ele só não tem o direito
de obrigar as pessoas a serem iguais a ele. Muito menos de cometer
violência contra elas por essas razões.
Sabe o “meu corpo, minhas regras”? Pois é. Por mais identificado que esse slogan
esteja com o feminismo, essa é a base do liberalismo: a defesa radical
da propriedade. É o seu corpo. São as suas regras. Desde que elas não
atrapalhem as demais pessoas, você manda. E isso vale para absolutamente
todas as coisas – é isso que está por trás do don’t tread on me,
afinal. Sabe quando um cara de esquerda diz para um liberal privatizar a
mãe dele? Ele pode até rir disso, mas o liberal já defende que a mãe
dele seja privatizada – ou seja, que caiba a ela, dentro de limites
absolutamente privados, as decisões sobre o seu corpo. E isso vale para
todas as mulheres. Sem exceção.
E é por
isso que a base do liberalismo é o individualismo. Leia-se: a noção que o
indivíduo é o juiz supremo das suas decisões e que as suas ideias
deveriam governar a sua vida. E é por isso também que os liberais
rejeitam o socialismo e o coletivismo. Leia-se: a noção que a livre
escolha dos indivíduos é um mal e que cabe ao Estado ser o juiz supremo
das suas decisões e das ideias que governarão a sua vida.
De fato, a esquerda, em geral, diz construir seus valores a partir dessa mesma noção do “cada um no seu quadrado”,
especialmente porque acredita monopolizar a defesa de políticas
públicas pró-minorias. Muita gente, aliás, se identifica com os valores
de esquerda porque são guiados, muitas vezes de forma inconsciente, pelo
individualismo – em especial, ao combate à violência contra mulheres,
gays, trans e minorias étnicas. Mas até para essas minorias tudo que a
esquerda tem a oferecer é uma defesa parcial de valores.
Veja o caso do “meu corpo, minhas regras”,
por exemplo. À esquerda, ao combater o livre mercado, nem esse é um
conceito absoluto. Quer dizer, ele serve sempre que uma mulher busca
defender sua integridade física de eventuais estupradores, mas não a
respeito da forma como ela usa o seu corpo para o seu próprio sustento –
ou seja, caso você seja uma mulher o corpo é seu, mas o seu bolso, e
aquilo que você coloca dentro dele através do suor do seu corpo,
pertence às outras pessoas. Dizendo de outra forma, para a esquerda as
mulheres devem ser livres em seus comportamentos, mas escravas de um
robusto aparato burocrático na forma como utilizam seus corpos para
sustentar tais comportamentos; devem ser livres para escolher com quem
se relacionam numa cama, mas devem inúmeras satisfações com quem se
relacionam no trabalho.
E o mesmo
vale para as minorias. Mesmo um transexual que queira construir uma loja
que atenda transexuais como nicho de mercado, e que conte apenas com
funcionários e fornecedores transexuais, gerando inclusão, deve inúmeras
satisfações a um aparato coercitivo sustentado por uma visão muito
conivente à esquerda que afirma que os mercados devem ser fortemente
regulados. Muitas vezes, o custo para sustentar tantos tributos e a
burocracia oficial são cruciais para que o negócio sequer exista. Todos
os transexuais pagam a conta por isso.
Nem
a liberdade de expressão escapa dessa defesa parcial. À esquerda, ela é
um valor importante em manifestações artísticas, protestos de rua e em
salas de aula – ainda que tais manifestações sejam grotescas ou
ofensivas a determinados grupos. Mas deve ser, no entanto, censurada
sempre que exercida de forma ofensiva a outros grupos, como se houvesse
uma moral distinta para diferentes públicos. Acontece que a liberdade de
expressão não é um direito adquirido para o monopólio de uma
organização política, ou ainda para que as pessoas desejem bons finais
de semana umas às outras. Pelo contrário. A liberdade de expressão só
existe para dar sustentação aos discursos que rejeitamos. Caso
contrário, ela não faria o menor sentido – haveria apenas um conjunto
de discursos pré-fabricados à disposição das expressões. Ora protegeria
determinados grupos, ora outros.
Se nós
somos aquilo que pensamos, a liberdade de pensamento é o que torna todas
as demais liberdades possíveis. E é por isso que esse é um valor
inegociável ao liberalismo. Mesmo que a sua prática possa
inevitavelmente soar ofensiva. Ideias só devem ser combatidas com ideias
melhores. Aos liberais, o primeiro dos direitos deve ser o de pensar – e
naturalmente transmitir ideias sem medo de repressão. Logo, não
deve estar entre os poderes do Estado decidir o que os cidadãos pensam e
quais conteúdos podem ou não ser expressados.
No fim, ao
censurar aquilo que as pessoas dizem, o que a esquerda cria
indiretamente é uma barreira à livre circulação de ideias e
questionamentos. E é exatamente isso que marginaliza as minorias que ela
diz defender.
2. Pelos mais pobres.
Você
dificilmente lerá isso numa publicação de esquerda, mas países mais
simpáticos ao livre mercado tendem a ser mais prósperos do que países
com economias mais fechadas. E aqui, há cinco bons gráficos que mostram
como isso ocorre.
Por
exemplo: quanto mais livre economicamente é um país, maior é a renda
per capita da população, em paridade de poder de compra.
Ou seja,
se nós juntarmos todos os países do mundo e compararmos quanto cada um
tem como renda per capita média (com dados do Banco Mundial) e liberdade
econômica (com dados do Fraser Institute), o resultado final será
indiscutível: quanto maior o apreço às instituições de mercado, maior o
desenvolvimento. E isso não raramente é algo que os próprios partidários
de esquerda tendem a aceitar – o que eles afirmam é que essa riqueza é
construída a partir da exploração dos mais pobres. Mas será que isso faz algum sentido?
Pelo contrário. Quando nós cruzamos os mesmos dados, o
cenário de desenvolvimento se mantém o mesmo quando selecionamos apenas
a parte mais pobre da população. Como o gráfico abaixo mostra, quanto
mais livre economicamente é um país, maior a renda per capita daqueles
que preenchem os primeiros 10% da base da pirâmide – leia-se: a
parte mais pobre daquele país.
E
isso ainda não diz tudo. Com o poder de renda maior da população, que
permite um acesso melhor aos serviços de saúde e saneamento básico, a
liberdade econômica também impulsiona a expectativa de vida. Segundo a ONU,
a diferença da expectativa de vida entre Hong Kong (o lugar
economicamente mais livre do mundo e com a maior expectativa de vida do
planeta) e a Venezuela (o país economicamente mais fechado do mundo) é
de 10 anos. Em geral, os mais pobres nos países mais livres não apenas
ganham, em média, mais do que os mais pobres dos países menos livres,
como também vivem pelo menos uma década a mais.
Às
minorias, o efeito é ainda mais visível. Com o poder de renda maior, que
permite um acesso melhor à educação, quanto mais livre economicamente é
um país, mais propenso ele está também
em garantir direitos políticos e liberdades civis. O que na prática
torna muito melhor ser parte de uma minoria (sexual, étnica ou
religiosa) num país mais liberal economicamente do que num mais
intervencionista.
Por fim,
com menos poder concentrado nas mãos do governo – logo, menos dinheiro
nas mãos dos políticos – menor também é a percepção de corrupção de um
país quando o ranking de liberdade econômica é colocado em perspectiva
com o ranking de corrupção da organização alemã Transparência
Internacional. Aqui, quanto maior a pontuação, melhor o resultado.
Tudo isso soa muito evidente agora, não? A questão é que temos um grande problema pela frente: no ranking
de facilidade para fazer negócios, do Banco Mundial, nós estamos atrás
de países como Zâmbia, Nepal, Suazilândia, Vietnã e Cazaquistão. No ranking do Fraser Institute, nós estamos no último quintil, atrás de países como Bangladesh, Bolívia, Haiti, Nigéria e Namíbia. No ranking
da Heritage Foundation, que também mede a liberdade econômica no mundo,
nós estamos atrás de países como Camboja, Nicarágua, Honduras, Butão e
Tanzânia. E pior: apesar de nunca ocuparmos boas posições nesses
rankings todos (e isso inclui a década de 90, encarada por parte de uma
militância política antiliberal como um período de liberdade econômica),
nos últimos anos estamos piorando em todos eles.
Ou seja,
você pode até ter o seu pé atrás com questões liberais mais radicais,
como a instauração de um Estado mínimo ou o corte imediato de todos os
gastos do governo, mas parece evidente que o Estado brasileiro é grande,
caro e burocrático demais, e que diminuir suas atribuições é uma pauta
urgente para o país – de forma especial para os mais pobres.
3. Por inclusão.
Liberais
identificam muitos dos problemas sociais apontados pela esquerda. O que
os difere nessa questão são as soluções encontradas, radicalmente
contrárias. Enquanto parte da esquerda acredita numa centralização
dessas questões ao Estado, entregando para os políticos muito dinheiro e
poder de influência, liberais entendem que cabe ao Estado as
garantias que permitem as condições institucionais ao desenvolvimento
econômico e à segurança das pessoas, ao mesmo tempo em que
identificam que o mercado é a maior máquina de inclusão já inventada
pela humanidade.
E nós
vivemos um período mágico a esse respeito. Pare pra pensar. Quantas
vezes você já viu recentemente empresas defenderem questões sociais? Não
dá pra contar nos dedos. Nos últimos anos, companhias como Microsoft,
Motorola, Google, Amazon, Starbucks, Facebook, Nike, Coca-Cola, Apple,
Youtube, Walmart, Spotify, Disney, Toyota, Burger King e Dell – e isso
só para ficar nas maiores –
já defenderam publicamente, por exemplo, o casamento entre pessoas do
mesmo sexo. Quantos governos assumem publicamente essas bandeiras?
O fato é
que há um custo econômico muito grande para uma empresa repudiar
questões sensíveis às minorias – e não raramente tais empresas se
apresentam como propagadoras dessas bandeiras. E isso não vem de hoje.
Desde as primeiras reformas liberais, já no final do século dezessete,
pensadores como Voltaire ou economistas como Samuel Ricard,
identificavam como o comércio cria incentivos para a tolerância. O fato é
que se você está trocando favores com alguém num negócio, seu cliente
é mais valioso para você vivo do que morto. Quer dizer, um bom
negociante precisa manter os clientes satisfeitos ou a concorrência os
roubará, não é mesmo? E quanto mais clientes ele atrair, mais rico
ficará. Isso cria uma roda de incentivos que a médio prazo muda a
percepção das pessoas sobre determinados tabus. Ou seja, dói no bolso
ser preconceituoso.
Certamente poucas palavras traduzam esse espírito como Groundswell – o
nome que se dá ao movimento espontâneo de indivíduos que, normalmente
através da grande rede, se conectam para obter informações, ideias,
indicações, reclamações e descontos uns dos outros. Nesse cenário, onde
todos nós estamos inseridos, as empresas perdem a cada dia o controle da
comunicação de suas marcas e repassam esse poder de forma
definitiva para os consumidores. Dessa forma, se “a sociedade
capitalista é uma democracia na qual cada centavo representa uma cédula
eleitoral”, o Groundswell seria uma evolução institucional da
democracia dos consumidores. E esse novo arranjo segue tendências muito
parecidas com a da velha democracia política: uma maior exigência dos
próprios consumidores, não mais interessados apenas em produtos que
melhorem seus padrões de vida, mas em compreender o impacto que essas
marcas causam na sociedade.
O Cone Cause Evolution Study encontrou
83% de americanos que dizem preferir adquirir marcas que apoiam causas
sociais e 41% que haviam adquirido um produto apenas porque ele estava
associado a alguma causa social. Esse número dobrou nessas últimas duas
décadas. 85% dos consumidores possuem uma imagem mais positiva de uma
empresa quando ela suporta causas sociais pelas quais eles se preocupam.
Além disso, 90% querem que as empresas lhes mantenham informados de que
maneira estão apoiando causas sociais. E o impacto não termina por aí:
80% dos americanos são propensos a trocarem de marcas, com qualidade e
preço similares, que apoiem uma causa social.
E a humanização não
morre nos consumidores – os funcionários das empresas também não
escapam. Funcionários que estão mais envolvidos em programas sociais de
suas empresas são 28% mais propensos a terem orgulho dos seus valores e
36% mais propensos a sentirem um forte senso de lealdade em relação aos
funcionários que não estão envolvidos. São números nunca antes vistos.
De fato,
se a violência contra minorias vem diminuindo drasticamente ao redor do
mundo nos últimos três séculos é, em partes, porque vimos o
desenvolvimento de uma robusta sociedade de mercado, capaz de aumentar
consideravelmente a renda per capita mundial, possibilitando um aumento
da segurança e dos padrões educacionais, e permitindo maior empatia
entre diferentes grupos étnicos, sexuais e religiosos através dos
negócios.
4. Contra as grandes corporações e os grandes banqueiros.
Pare e
pense. Você é um empresário bem sucedido que emprega milhares de pessoas
e mantem um alto padrão de vida por isso. Qual seu interesse no
negócio? Até uma criança de cinco anos poderá respondê-la: abocanhar a
maior fatia do mercado possível – afinal de contas isso se traduz em
grana no bolso. Agora, diga com sinceridade. Qual cenário você prefere
aqui: um que diminua impostos e a burocracia no país, para que em pouco
tempo você receba concorrência e diminua sua participação no mercado, ou
um que mantenha ele fechado? Evidente que há empresários que apostarão
suas fichas num cenário economicamente mais livre por suas próprias
consciências – e ainda outros que buscarão essa liberdade porque se
sentem prejudicados na busca pelas primeiras posições. Mas os incentivos
econômicos para os que são realmente grandes levam ao
intervencionismo, não ao livre mercado. E é por isso que soa tão
estranho quando alguém de esquerda afirma que o liberalismo é uma
filosofia que defende os interesses dos mais ricos – na verdade é o
exato oposto.
Não é uma
coincidência que tantas empresas se aproximem de diversos governos ao
redor do mundo para fazer lobby. É isso que operadoras de telefonia
fazem contra o WhatsApp. É isso que os grandes cartéis de táxi fazem
contra o Uber. É isso que operadoras de televisão por assinatura fazem
contra a Netflix. Para um liberal, isso é tudo muito previsível – o
Estado é um grande agregador de poder. Através dele, políticos dos mais
diferentes partidos costumam aproximar capital econômico para a
construção de capital político, e em contrapartida, grandes empresários
ajudam a alimentar a roda, em busca do cálice de ouro.
E é por isso que, não raramente, grandes empresários e banqueiros são os maiores inimigos do liberalismo. Pegue a lista das 10 famílias mais ricas
do país, por exemplo. Quantas enriqueceram em seus setores de atuação
graças à proteção estatal? A família Marinho (da Rede Globo) enriqueceu
graças a uma concessão cedida pelo Estado – e historicamente está ligada
a grupos de pressão que inibem concorrência na tv aberta e fechada,
além do setor de on demand. Mas ela não é a única. As famílias Safra (de Joseph Safra, o banqueiro
mais rico do mundo), Moreira Salles (do Unibanco), Villela (da Itaúsa) e
Aguiar (do Bradesco) controlam alguns dos maiores bancos do país, e
atuam num setor com muita proteção estatal (nunca é demais lembrar
que 53% do setor financeiro nacional é de propriedade do governo). A
família Camargo (da Camargo Correia) e Odebrecht vivem de operar
concessões públicas e não raramente estão envolvidas em escândalos de
corrupção estatal. A família Batista (da holding J&F, que controla
empresas como a JBS) cresceu como uma campeã nacional das últimas
administrações federais (o governo detém 1/3 dela). E a família Maggi
(uma das maiores produtoras de soja do mundo) é ligada à política
(Blairo Maggi é o atual Ministro da Agricultura).
E não se
engane. Essa não é uma coincidência. Há outras tantas famílias no
ranking das primeiras colocadas que poderiam perfeitamente preencher
parágrafos desse texto. Mas acho que você é inteligente o suficiente
para entender o que quero dizer aqui.
De
fato, governo é aquele negócio que a gente vive chamando pra conter a
ganância do capitalismo. As desculpas são sempre as mesmas: se não fosse
por ele, a mão invisível do mercado criaria uma desigualdade
irrefreável. E aí o que acontece? O governo, ele mesmo, vira um grande
catalisador de desigualdade, distribuindo subsídios a empresários
amigos, desonerações, financiando fusões de grandes empresas, alterando
leis, defendendo seus interesses lá fora. Dessa maneira, sai governo e
entra governo, ora mais à esquerda, ora mais à direita, Brasília
vira uma máquina gigante de concentração de poder e riqueza, a maior propulsora de desigualdade do país,
que atrai agentes econômicos interessados em subverter a ordem natural
dos mercados pela única razão de que seduzir uma salinha pública com uma
maleta de dinheiro é muito mais fácil do que conquistar um mercado com
competição e inovação. Assim, o inimigo da concentração de riqueza
vira uma mera quitanda para lobistas. Seu negócio é criar dificuldades
para vender facilidades – e quem está disposto e tem cacife para
bancá-lo, se dá bem no final.
E isso é
tudo que o liberalismo tem a oferecer aqui – descentralização econômica.
Diminuir ao máximo a soma de poder que permite com que empresários
obtenham sucesso e se tornem oligopólios e monopólios sem qualquer
mérito de mercado. A maior parte dos grandes capitalistas do mundo
enriqueceram exatamente graças a essa nossa noção equivocada que os
governos devem se meter de forma demasiada nas economias – e quanto mais
essa política fracassa, mas insistimos estupidamente em fortalecê-la
para evitar que novos grandes capitalistas surjam.
Chegou a
hora de mudar de plano. Ainda dá tempo de abraçar novas ideias e
construir um mundo socialmente mais tolerante e economicamente mais
racional. Se você acredita nesses dois valores, você provavelmente é um
liberal. Você só não sabia disso ainda.